Este blog visa reunir textos e comentários dos alunos da disciplina Sociologia da Ciência e da Técnica, oferecida no segundo semestre de 2010 no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFSC, sob a coordenação da Profª Tamara Benakouche. A disciplina tem como objetivo analisar a produção da ciência e a inovação tecnológica como elementos centrais para o entendimento da dinâmica social moderna. Nesse sentido, visará o estudo de questões teóricas - colocadas por autores clássicos e contemporâneos - e práticas, postas por processos sócio-políticos mais recentes. Adotando a perspectiva construtivista, procurará desenvolver uma crítica a análises que sustentam a natureza apolítica da pesquisa científica e o determinismo da técnica, resgatando a importância de novas formas de cidadania científica e das redes sociotécnicas.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Ernest Mandel: O Capitalismo Tardio

Por Ney Jansen

Envio um trecho do livro de Ernest Mandel “O Capitalismo Tardio” em que o autor critica o que ele chamará de absolutização dos conceitos de “racionalidade econômica” e “racionalidade tecnológica” e que nos permite dialogar com os textos de Marcuse, Habermas e Beck. O conceito de “capitalismo tardio” também foi utilizado por teóricos da escola de Frankfurt como Marcuse e Adorno.

Abaixo algumas informações sobre Mandel e o conceito “capitalismo tardio” (fonte: Wikipédia).

Ernest Ezra Mandel (1923-1995) foi um economista e político judeu-alemão radicado na Bélgica. Marxista desde os 16 anos, de linha trotskista, contribuiu com suas críticas ao marxismo anti-stalinista. Durante a Segunda Guerra Mundial, Mandel atua na Resistência contra o nazismo. Preso em 1944, é levado à prisão de Saint-Gilles, de onde consegue fugir antes de ser deportado para Auschwitz. Obtém a licenciatura pela École Practique des Hautes Études da Sorbonne, na França, em 1967.

A partir de 1968 Mandel torna-se uma figura pública, sendo conhecido como político marxista, ao percorrer várias universidades européias - (Turim, Louvain, Berlim, Cambridge, Lunde) - e americanas, ministrando conferências sobre Socialismo, Imperialismo e Revolução.

Apesar de sua reputação científica e da sua grande popularidade entre os estudantes, entre o final da década de 1960 e os anos 1970 Mandel é oficialmente impedido de ingressar em vários países da europa ocidental e também nos países stalinistas do leste europeu, por ser considerado perigosamente subversivo e até um terrorista.

Embora oficialmente impedido de entrar na antiga Alemanha Ocidental, em 1972 obteve seu PhD, na Universidade Livre de Berlim por sua tese Der Spätkapitalismus – Versuch einer marxistischen Erklärung ("O Capitalismo tardio - uma tentativa de explicação marxista"). Lecionou na Universidade Livre de Berlim por alguns meses e posteriormente tornou-se docente da Universidade Livre de Bruxelas.

O conceito de capitalismo tardio refere-se à fase contemporânea do desenvolvimento capitalista.

Mandel apresenta três fases do desenvolvimento capitalista:

A 1ª fase: o capitalismo de mercado, entre 1700 e 1850; a 2ª fase: o capitalismo monopolista, até aproximadamente 1960, quando se dá o esgotamento do 'boom' de reconstrução pós-guerra; a 3ª fase: o capitalismo tardio, que teria como elementos distintivos a expansão das grandes corporações multinacionais, a globalização dos mercados e do trabalho, o consumo de massa e a intensificação dos fluxos internacionais do capital. Seria mais propriamente uma crise de reprodução do capital do que um estágio de desenvolvimento, uma vez que o crescimento do consumo (e portanto, da produção) tornar-se-ia insustentável pela exaustão dos recursos naturais.

O estágio tardio teria entre suas principais características, uma enorme expansão da capacidade produtiva, baseada no desenvolvimento tecnológico, resultando em superprodução, porém, com redução do emprego industrial mediante transferência de postos de trabalho para o setor terciário ("terceirização" das atividades de apoio, não diretamente ligadas à produção industrial) e precarização do emprego, deslocando-se o centro de gravidade da produção social da indústria para os serviços ("terciarização" da economia).

Confira o texto:
O Capitalismo Tardio

Relatos da Sessão 9 - 21/10/10


Relatos da Sessão 9 - A Sociologia dos Cientistas: para não dizer que não falamos de Bourdieu

Por Fernanda Mambrini Rudolfo e Karlo Koiti Kawamura

Pierre Bourdieu não é um sociólogo da ciência, mas “O campo científico”, o texto base da aula é considerado um clássico da disciplina. Vejamos os principais conceitos que foram debatidos:

Campo: A sociedade não está separada do indivíduo (o autor se opõe à separação sociedade x indivíduos, bem como entre estrutura x função). As relações na sociedade se estruturam em campos (campo social, campo político, etc.). As ações dos indivíduos se manifestam através de práticas, estratégias e disposições. Os campos são hierarquizados em virtude do capital específico acumulado pelos agentes e em cada um haverá dominantes e dominados (assim, por exemplo, no campo científico o capital que importa é o conhecimento).

Os capitais são diferentes, mas há uma afinidade entre eles, e todos se distribuem dentro do campo social. Bourdieu destaca em seu trabalho a noção de prestígio ou de distinção, que seria o estilo de vida que distingue os indivíduos na sociedade (Bourdieu salienta a importância do local onde nós nascemos) mas também reconhece que há uma certa permeabilidade entre os campos.

Habitus: As práticas dos agentes são orientadas por disposições que são aprendidas, mas que se tornam uma espécie de natureza desses agentes; isso constitui o que Bourdieu chama de habitus. É mais do que o hábito, pois se incorpora na pessoa; constitui o que chama de uma estrutura estruturada e estruturante. As principais instituições onde o habitus se constitui são a família e a escola (daí a idéia de que elas são os espaços de reprodução social).

Capital: São as características consideradas importantes dentro de cada campo (social, político, científico, artístico, etc.) e o capital que se tem vai influenciar a posição que se ocupa em cada campo, seja de dominante ou de dominado.

Mudança social: A atividade de pesquisa de Bourdieu se iniciou a partir da temática da reprodução social, ou seja, de como a sociedade muda, mas, ao mesmo tempo, de como a sociedade se mantém (Plus ça change, plus c´est la même chose). De acordo com o autor, sempre há estratégias de conversão (subversão), mas também de manutenção. O autor estudou, a partir da escola, os aparelhos de reprodução de desigualdades sociais. Bourdieu é reconhecido, por esse motivo, como o sociólogo da reprodução, mesmo se também questione por que a sociedade muda e como isso acontece (tema central na Sociologia). Contudo, considera-se que ele não explica satisfatoriamente como ocorre a mudança social, sendo por isso criticado. Por exemplo, Bourdieu não explicaria como algumas pessoas humildes conseguem furar o bloqueio da reprodução social e ascender.

Outros pontos debatidos:

O campo científico é, como os outros campos, um microcosmo social, parcialmente autônomo, ou seja, está submetido a regulações. Há uma ligação muito forte entre o campo científico e o campo político (que acaba por permear quase todos os campos).

Para Bourdieu, a reflexividade é uma condição do fazer sociológico: o conhecimento da sociedade deve ser reflexivo – no sentido de permanentemente discutido – para assegurar sua validade.

Apresentou-se, na aula, uma entrevista simulada com Pierre Bourdieu, a partir de trechos do segundo artigo indicado para leitura (da revista Política e Sociedade) Com base em perguntas fictícias, discutiram-se os principais conceitos trazidos pelo autor (alguns já mencionados neste relato), bem como a aplicação da idéia de campo científico às ciências sociais. Um ponto destacado foi a afirmação a respeito da ausência do monopólio de um “discurso legítimo”, nas ciências sociais, situando-se entre os campos científicos mais puros e os campos político e religioso. Desenvolveu-se, ainda, debate a respeito da importância da internacionalização das ciências sociais para o progresso da autonomia científica, visto que Bourdieu sugere essa alternativa para as ciências sociais (uma internacional de outsiders). A fim de concretizar o progresso de uma ciência social autônoma, dever-se-ia evitar, ainda, a tentação do populismo (ou seja, deve-ser ser um cientista, não um militante).

Os jornalistas são concorrentes dos cientistas sociais. Bourdieu critica a televisão em um de seus livros, principalmente por não dar tempo aos cientistas para exporem seu pensamento.

Uma questão debatida foi se a sociologia da ciência tenta desmistificar, mostrar que a ciência também tem seus limites. Há um ‘endeusamento’ da ciência para as pessoas comuns, como se ela não pudesse ser questionada, confrontada (só poderia ser ‘contestada’ por cientistas e, ainda, somente se tiverem ‘autoridade’). Na realidade, produzir ciência seria uma prática social como qualquer outra e uma idéia pode ser debatida tanto pelos cientistas como pelos profanos (não cientistas).

Por fim, discutiu-se a idéia de revolução científica de Kuhn, a partir das críticas feitas por Bourdieu de que elas são mais difíceis hoje, porque o campo e suas estratégias estão mais cristalizadas (há normas científicas mais rígidas). Uma possibilidade, porém, é que surjam fatores externos (exógenos) que façam com que o postulante a “dominador” tenha outra motivação (ferocidade). Por exemplo, Einstein, sendo judeu, pôde revolucionar a ciência, pois sua motivação era pessoal e ia além das estratégias do campo. Como se pode explicar, então, o fato de Planck ter “revolucionado” a física, sendo do grupo dominante?

Por Rosana de Jesus


Pierre Bordieu
Os debates na aula giraram em torno das idéias principais deste pensador, as quais versam sobre como ocorrem os processos de mudanças, transformações e reproduções sociais. Ele teorizou sobre como a sociedade se reproduz, estudando principalmente a escola como elemento de reprodução das desigualdades sociais e não como possibilidade de mobilidade social. Criticou a idéia de opostos: Sociedade x Indivíduo / Estrutura x Função (práticas, estratégias, disposição) e para substituí-la criou conceitos fundamentais como Campo e Habitus.

[...] Bourdieu vai observar que a sociedade se constitui de variados campos, estes, mundos sociais relativamente autônomos (religioso, político, artístico, científico, filosófico, da arte, jornalístico, masculino, etc.). Caracterizar os campos como autônomos implica em considerar que neles há um modus próprio de atuação, o que implica também a idéia de que a atuação do agente no campo é estruturada e estruturante. [...] Tal idéia remonta a se pensar que Bourdieu substitui a luta de classes, motor da história em Marx, pala luta de classificações – derivadas do capital econômico e do capital cultural, motor da lógica do espaço social. (MOCELIN, 2010)

[...] o conceito de habitus que ele desenvolverá ao longo da sua obra corresponde a uma matriz, determinada pela posição social do indivíduo que lhe permite pensar, ver e agir nas mais variadas situações. O habitus traduz, dessa forma, estilos de vida, julgamentos políticos, morais, estéticos. Ele é também um meio de ação que permite criar ou desenvolver estratégias individuais ou coletivas. (VASCONCELOS, 2002)


Analisando a sociedade como organizada por meio de campos, defende que dentro destes emerge o que nomeia por Capital Simbólico, uma espécie de prestigio que o individuo acumula no campo, hierarquizando posições em seu interior, podendo o individuo ocupar o lugar de dominado ou de dominante. A estrutura do campo, dada pelo capital simbólico, pode ser alterada por embates de forças oriundas de seu próprio interior. Mesmo que haja a intenção de mudar determinada realidade para melhor, sempre haverá resistência para sua conservação, para sua manutenção.
No que diz respeito ao campo científico – tema da aula – Bourdieu acredita que há um valor intrínseco na ciência, que é encontrar uma verdade; no entanto, afirma que há uma luta pelo capital simbólico no campo científico.
Ele não estuda as práticas internas da ciência tal como Latour, mas identifica que a ciência resulta de uma pratica social como qualquer outra, pautada pela luta dos cientistas por reconhecimento.
Também foi levantada nesta sessão a afirmação de Bourdieu segundo a qual a noção de revolução de Kuhn não valeria na atualidade, posto que as normas mais rígidas de controle na ciência trariam mais dificuldades de ocorrer mudanças; no caso, estas só ocorreriam por motivos externos. Por outro lado, foi dito que o físico Max Planck, que desenvolveu a teoria quântica passou 30 anos querendo desmenti-la, pois estava contra seus princípios.

Referências da disciplina
BOURDIEU, Pierre. O campo cientifico. In: ORTIZ, R. (Org.). Pierre Bourdieu. São Paulo: Ática, 1983, p. 122-155.
_______. A causa da ciência. Como a historia social das ciências sociais pode servir ao progresso das ciências. Florianópolis: PPGSP, Política & Sociedade, n. 1, setembro de 2020, p. 144-161.

Outras referências
AZEVEDO, Mário Luiz Neves de. Espaço social, campo social, habitus e conceito de classe social em Pierre Bourdieu. Disponível em: . Acessado em: 24 out. 2010.

MOCELIN, Daniel G. Pierre Bourdieu: a prática social entre o campo e o habitus. Disponível em: . Acessado em: 24 out. 2010.

VASCONCELOS, Maria Drosila. Pierre Bourdieu: a herança sociológica. Disponível em: . Acessado em: 24 out. 2010.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS:
Há na Revista Escola uma edição que apresenta as idéias de Bourdieu e sua influencia na área educacional. O titulo da matéria é: Pierre Bourdieu - O investigador da desigualdade. A biografia abaixo apresentada foi tirada do mesmo sitio.
O link é < http://revistaescola.abril.com.br/historia/fundamentos/pierre-bourdieu-428147.shtml >
Biografia
Pierre Bourdieu nasceu em 1930 no vilarejo de Denguin, no sudoeste da França. Fez os estudos básicos num internato em Pau, experiência que deixou nele profundas marcas negativas. Em 1951, ingressou na Faculdade de Letras, em Paris, e na Escola Normal Superior. Três anos depois, graduou-se em filosofia. Prestou serviço militar na Argélia (então colônia francesa), onde retomou a carreira acadêmica e escreveu o primeiro livro, sobre a sociedade cabila. De volta à França, assumiu a função de assistente do filósofo Raymond Aron (1905-1983) na Faculdade de Letras de Paris e, simultaneamente, filiou-se ao Centro Europeu de Sociologia, do qual veio a ser secretário-geral. Bourdieu publicou mais de 300 títulos, entre livros e artigos. Fundou as publicações Actes de la Recherche en Sciences Sociales e Liber. Em 1982, propôs a criação de uma "sociologia da sociologia" em sua aula inaugural no Collège de France, levando esse objetivo em frente nos anos seguintes. Quando morreu de câncer, em 2002, foi tema de longos perfis na imprensa européia. Um ano antes, um documentário sobre ele, A Sociologia É um Esporte de Combate, havia sido um sucesso inesperado nos cinemas da França. Entre seus livros mais conhecidos estão A Distinção (1979), que trata dos julgamentos estéticos como distinção de classe, Sobre a Televisão (1996) e Contrafogos (1998), a respeito do discurso do chamado neoliberalismo.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Relatos da Sessão 8 - 14/10/10

Relatos da Sessão 8 - Tema: Dê-me um laboratório...

Por Cristian Stassun

LOCALIZAÇÃO DO AUTOR
Bruno Latour (Beaune, 22 de junho de 1947) é um filósofo e antropólogo francês. A sua principal contribuição teórica é - ao lado de outros autores, como Michel Callon - o desenvolvimento da ANT - Actor Network Theory (Teoria ator-rede) que, ao analisar a atividade científica, considera, enquanto variáveis, tanto os atores humanos como os não-humanos, estes últimos devido à sua vinculação ao princípio de simetria generalizada. É conhecido pelos seus livros que descrevem o processo de pesquisa científica, dentro da perspectiva construtivista, que privilegia a interação entre o discurso científico e a sociedade; vale destacar Vida de Laboratório (com Steve Woolgar), Jamais Fomos Modernos e Ciência em Ação. Latour possui doutorado em Filosofia e atualmente é professor do Institut d´Études Politiques de Paris e da Universidade da Califórnia em San Diego. Realizou estudos etnográficos na África e na América, mas sua etnografia mais conhecida foi feita no Laboratório de Neuroendocrinologia do Instituto Salk, na Califórnia, a qual deu origem ao livro Vida de Laboratório, o qual foi inicialmente discutido na aula. (Fonte: Wikipédia).

LOCALIZAÇÃO DA OBRA
A Vida de Laboratório – A produção dos fatos científicos – Bruno Latour e Steve Woolgar
“Como ocorre a produção de fatos científicos? No mundo, a Antropologia já estudou tribos, costumes exóticos, representações simbólicas, tradições populares e os cultos mais complexos. Mas a indústria, a técnica, a ciência e a administração pouquíssimas vezes foram estudados. Ninguém imagina como é o dia-a-dia de um laboratório – técnicos que entram e saem, pesquisadores debruçados em suas bancadas e pilhas de papel, instrumentos, materiais, substâncias químicas e animais que chegam a todo momento, milhares de dólares gastos a cada dia e, talvez, algum mistério decifrado. “Um quebra-cabeça quase terminado guiado por um campo invisível”, define o etnólogo francês Bruno Latour, que se uniu ao sociólogo inglês Steve Woolgar para analisar a produção social do objeto científico. Assim nasceu este estudo inédito sobre a vida de laboratório e a produção dos fatos científicos.”

RELATO AULA
Os alunos chamam a atenção para a discussão do início do livro, no capítulo Etnografia das Ciências (razão de ser da etnografia de um laboratório).
Edson afirma que há várias maneiras de se dizer, polissemia, mas sempre se fala de diferentes lugares. O cientista falando de determinado papel e o cientista fazendo ciência. A etnografia romperia a metalinguagem e levaria a analisar a prática do laboratório sem a rebuscada máscara dos termos e tecnicismos.
Tamara esclarece que esse texto é essencialmente metodológico. Defende a necessidade de se respeitar a linguagem dos  interlocutores, sem reinterpretá-la por outro autor, entendendo que as assertivas do autor estão sob um contexto específico.
O texto explica como é possível estudar os atores sem se tornar um cientista, mantendo um distanciamento, sem incorporar a linguagem dos atores como sua, ou como verdadeira ou falsa. A estratégia é a etnografia que não assume a teoria estudada, apenas descreve as atividades de determinados grupos e populações.
Latour não pretende estudar a ciência feita (“pronta e velha”), o que já está naturalizado pelo discurso científico, mas investir na construção da ciência, na ciência enquanto se fazendo.
Tamara descreve em seguida o conteúdo dos capítulos do livro, lembrando que em cada um deles Latour assume uma identidade diferente, o que irá condicionar o seu olhar, ou suas práticas de investigação.

Capítulo 2 – O antropólogo -  O capítulo descreve a visita de um antropólogo em um laboratório. Prática de ler e anotar.
                   
Capítulo 3 – O historiador - Explica a trajetória da substância pesquisada no laboratório, viajando livremente no passado. Estudo de uma enzima específica.

Capítulo 4 – O etnometodólogo - Faz a etnografia dos cientistas, quem é quem, quem fala o que, qual a hierarquia das pessoas. Microssociologia dos fatos através dos ditos e fatos no laboratório.

Capítulo 5 – O sociólogo, dos mais clássicos que existem
Análise da credibilidade científica, capital científico. Não basta dizer, tem que saber quem disse. Trajetórias dos autores, currículo.
Conclusão
A ordem criada a partir da desordem. Os cientistas buscam sempre a ordem do universo, não entendendo que o próprio contexto científico e universo vive na desordem e somos nós que tentamos forjar padrões comportamentais, naturais e fixos.

TEMAS “SOLTOS”
Latour agradece ao chefe do laboratório que o autorizou a fazer a etnografia, cujo desinteresse tornou-a possível. No entanto, lembra que ele era francês, da sua região. Isso talvez tenha facilitado o seu aceite.
Estudar o laboratório é estudar toda a rede na qual ele está contido. Latour reconhece que não faz isso – pois só se fixou no laboratório – o que significa um limite no seu trabalho.

Creio que vale a pena reproduzir aqui o texto nas “orelhas” do livro.

"Ciência" é uma palavra em alta nas sociedades ocidentais (ou em todo o mundo "globalizado", o que dá na mesma). Uma lavagem de tapete, um corte de cabelo, um mapa astral ganham outro estatuto quando se afirma que são "científicos". Dessa forma, determinar o modo como a ciência é produzida, transmitida e exportada é tarefa essencial para a compreensão da sociedade contemporânea.
Das diferentes formas de se aproximar da ciência, a mais tradicional tem sido o estudo da estrutura do suposto "método científico". Os resultados tanto no domínio da filosofia como no da história ou da sociologia da ciência, parecem pouco convincentes. A ciência, central para o progresso, evolui, mas fica difícil atribuir seu sucesso a um método, a um conjunto de regras que todos os participantes do "jogo científico", tácita ou explicitamente, concordam em seguir.
Nos anos 70, pesquisadores tentam uma nova tática: estudar a atividade dos cientistas do mesmo modo que antropólogos estudam comunidades isoladas e distantes. Latour é um dos pioneiros nessa vertente, por sua clareza, acessibilidade e escolha de bons problemas para estudo, ultrapassou o círculo restrito a especialistas e alcançou reconhecimento mais amplo. Hoje, é um autor do qual se pode discordar, com cujos escritos se pode polemizar, mas é impossível não ter posição a seu respeito. E isso não é o suficiente para atestar sua relevância. A idéia de uma antropologia da ciência parece, de saída, um tanto imprópria. Faz-se antropologia de comunidades ditas primitivas ou simples, ou de subgrupos ditos mais ou menos homogêneos e simples dentro de uma sociedade complexa. Mas, e fazer antropologia da comunidade científica, do grupo por definição (não importa aqui se isso é verdade ou não) mais evoluído, racional e complexo do planeta? Os resultados com que Latour emergiu desses estudos antropológicos têm pouco a ver com a imagem que a própria comunidade científica tem de si e divulga externamente. Estudando os "nativos" (Latour foi antropólogo residente em um laboratório de bioquímica, na Califórnia, nos anos 70), o autor mostra que a essência da atividade científica é criar enunciados e subtrair-lhes modalidades (a partir do enunciado "X acha que a substância Y é responsável pelo efeito cuja medida é Z", criar o enunciado "Y causa Z") e transladar interesses, isto é, a comunidade acadêmica deve sempre aumentar as alianças entre seus membros e entre estes, seus equipamentos e o "mundo objetivo"; para isso, é preciso que todos se transformem no processo. Seu livro Vida de laboratório examina tais translações, mas é em Ciência em ação que as pesquisas antropológicas ganham dimensão de teoria geral acerca do funcionamento da ciência moderna.
Se os estudos nessa vertente antropológica - e a ambiciosa teoria daí derivada - vão ter resultados mais convincentes no que diz respeito ao estranho sucesso humano em compreender o mundo, ainda é cedo para saber. Mas é evidente desde já que o enfoque é original e ajuda a esclarecer o trânsito conturbado das vias que ligam ciência e sociedade.

Sumário do capítulo estudado:

Capítulo 3 - Máquinas
Introdução - As incertezas do construtor de fatos
Parte A - Translação de interesses
Parte B - Mantendo na linha os grupos interessados
Parte C - Modelo de difusão versus modelo de translação

RELATO DE AULA

Conceito central do capítulo: translação ou tradução, que significa a representação que uma pessoa tem de um determinado fato ou ideia. Quando o fato aceita a tradução, ou seja, se comporta de acordo com ela, diz-se que ele foi alistado.

Você pode afirmar, por exemplo, que a lua é feita de queijo, porém a verdade no seu argumento dependerá do conjunto de pessoas que irão acreditar em você e lhe citar.
“Precisamos de outras pessoas que nos ajudem a transformar uma afirmação em fato” (p.178).

Descrição sobre a história do motor Diesel e do post-it.

O meio científico é como um jogo de rúgbi, afirma Latour, você tem que está inserido em um grupo, convencer grupos que pensam igual ou não a você, envolver, seduzir as pessoas. São essas pessoas que ajudam na construção de um fato.

Um cientista é, assim, sobretudo um construtor de fatos:

“A tarefa do construtor de fatos está agora claramente definido: há um conjunto de estratégias para alistar e interessar os atores humanos e um segundo conjunto para alistar e interessar os atores não-humanos a fim de conservar os primeiros. Quando essas estratégias têm sucesso, o fato construído se torna indispensável; é ponto de passagem obrigatória para todos quantos quiserem promover seus próprios interesses. Pouco numerosas e indefesas no início, a ocuparem alguns pontos fracos, essas pessoas acabam depois controlando verdadeiras fortalezas. Todos adotam as afirmações ou os protótipos das mãos de contendores bem-sucedidos. Consequentemente, as alegações se transformam em fatos indiscutíveis e os protótipos são transformados em peças de uso rotineiro. A cada nova pessoa que acredita na alegação, a cada novo consumidor que compra o produto, a cada artigo ou livro em que o argumento é incorporado, a cada motor em que a caixa-preta é embutida, a sua propagação vai ocorrendo no tempo e no espaço.”(p.218)

Ao final da aula, Tamara expôs transparências com o conteúdo dos apêndices do livro.

APÊNDlCE 1
REGRAS METODOLÓGICAS

Regra l. Estudamos a ciência em ação, e não a ciência ou a tecnologia pronta; para isso, ou chegamos antes que fatos e máquinas se tenham transformado em caixas-pretas, ou acompanhamos as controvérsias que as reabrem.
(Introdução)

Regra 2. Para determinar a objetividade ou subjetividade de uma afirmação, a eficiência ou a perfeição de um mecanismo, não devemos procurar por suas qualidades intrínsecas, mas por todas as transformações que ele sofre depois, nas mãos dos outros. (Capítulo 1)

Regra 3. Como a solução de uma controvérsia é a causa da representação da Natureza, e não sua consequência, nunca podemos utilizar essa consequência, a Natureza, para explicar como e por que uma controvérsia foi resolvida. (Capítulo 2)

Regra 4. Como a resolução de uma controvérsia é a causa da estabilidade da sociedade, não podemos usar a sociedade para explicar como e por que uma controvérsia foi dirimida. Devemos considerar simetricamente os esforços para alistar recursos humanos e não-humanos. (Capítulo 3)

Regra 5. Com relação aquilo de que é feita a tecnociência, devemos permanecer tão indecisos quanto os vários atores que seguimos; sempre que se constrói um divisor entre interior e exterior, devemos estudar os dois lados simultaneamente e fazer urna lista (não importa se longa e heterogénea) daqueles que realmente trabalham (Capítulo 4)

Regra 6. Diante da acusação de irracionalidade, não olhamos para que regra da lógica foi infringida nem que estrutura social poderia explicar a distorção, mas sim para o ângulo e a direção do deslocamento do observador, bem como para a extensão da rede que assim está sendo construída. (Capítulo 5)

Regra 7. Antes de atribuir qualquer qualidade especial à mente ou ao método das pessoas, examinemos os muitos modos como às inscrições são coligidas, combinadas, interligadas e devolvidas. Só se alguma coisa ficar sem explicação depois do estudo da rede é que deveremos começar a falar em fatores cognitivos. (Capítulo 6)


APÊNDlCE 2
PRINCÍPIOS

Primeiro principio. O destino de fatos e máquinas está nas mãos dos consumidores finais; suas qualidades, portanto, é consequência, e não causa, de urna ação coletiva. (Capítulo 1)

Segundo princípio. Os cientistas e engenheiros falam em nome de novos aliados que conformaram e alistaram; representantes entre outros representantes, com esses recursos inesperados, fazem o fiel da balança de forças pender em seu favor. (Capítulo 2)

Terceiro princípio. Nunca somos postos diante da ciência, da tecnologia e da sociedade, mas sim diante de urna gama de associações mais fracas e mais fortes; portanto, entender o que
são fatos e máquinas é o mesmo que entender o que as pessoas são. (Capítulo 3)

Quarto princípio. Quanto mais esotérico o conteúdo da ciência e da tecnologia, mais elas se expandem externamente; portanto, "ciência e tecnologia" é apenas um subconjunto da tecnociência. (Capítulo 4)

Quinto princípio. A acusação de irracionalidade é sempre feita por alguém que está construindo uma rede em relação a outra pessoa que atravessa seu caminho; portanto, não há Grande Divisor entre mentes, mas apenas redes maiores ou menores. Os fatos duros não são regra, mas exceção, visto serem necessários em poucos casos para afastar um grande número de pessoas de seu caminho habitual. (Capítulo 5)

Sexto princípio. A história da tecnociência é, em grande parte, a história dos recursos espalhados ao longo das redes para acelerar a mobilidade, a fidedignidade, a combinação e a coesão dos traçados que possibilitam a ação a distancia.


Por Felipe Pontes

1 – Ciência na Periferia: a luz síncroton brasileira. Tese de Doutorado defendida no Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro), por Marcelo Baumann Burgos. Ele trabalha atualmente na PUC-RJ.
Neste estudo, o autor faz uma construção histórica da intelligentsia brasileira, fundamentando sua exposição em autores já trabalhados nesta disciplina, como Merton, Manheim, Bloor, Latour, etc. O projeto da Luz Síncroton é um caso que ilustra essa construção histórica, visto que, na posição do autor, demonstra uma mudança no comportamento dos cientistas brasileiros. Fundamentalmente, estes ultrapassam as barreiras do mundo universitário e do patrocínio exclusivo do Estado para buscar apoio no mercado e na sociedade civil.

2 – A Vida de Laboratório: a produção dos fatos científicos. De Bruno Latour e Steve Woolgar.
Bruno Latour é francês, coordenou o Centro de Estudos da Inovação da École des Mines, em Paris. Teve várias formações (Sociologia, Antropologia, etc). Ele fez etnografia de tribos na África (Costa do Marfim), seguindo Marc Augé. Hoje leciona no Institut d´Études Politiques de Paris, na França, trabalhando na formação de cientistas políticos e administradores. Woolgar é um sociólogo britânico.
Esse livro alcançou muita notoriedade. Sua primeira edição é de 1979. É considerado o primeiro estudo antropológico em laboratório, publicado. Tendo por objeto o Instituto Salk, Latour resolveu aplicar a metodologia etnográfica para estudar a “tribo” dos cientistas. Totalmente estranho ao ambiente, passou dois anos observando suas práticas. Seu parceiro de pesquisa, Woolgar, participou sobretudo da redação final do texto.

O aspecto mais debatido em sala e visto como mais interessante foi a exposição metodológica do trabalho. Um dos problemas metodológicos trazidos é o da linguagem da obra. Como ler os fatos dos cientistas sem entrar totalmente na linguagem deles? Os autores assumem a etnometodologia, e colocam-se numa posição de distanciamento dos atores para não se tornarem reféns da argumentação dos cientistas.

Destaca-se, ainda no plano metodológico, a utilização do conceito de simetria do Programa Forte, tentando transpô-lo ou radicalizá-lo. A obra destaca o caráter social da ciência, mas preocupa-se em tentar entender os códigos esotéricos dessa atividade. A ciência para Latour seria mais do que seu aspecto cognitivo. Outro aspecto enfrentado é a cisão epistêmica das Ciências Humanas e Naturais, tomando-se como um desafio não separar sociedade e natureza, Sociologia e Ciência. O sociólogo da ciência pode e deve entrar na explicação das duas áreas, sem aceitar a oposição entre uma e outra.

Retornando à questão da linguagem no debate, destaca-se a frase: “Faça o que quiser, mas não faça da linguagem deles (os atores estudados) a sua metalinguagem”. O sociólogo da ciência deve ir contra a linguagem do informante e da própria sociologia. Seguir os atores, mas não reinterpretar os discursos desses atores (a partir de uma teoria), nem utilizar a linguagem de defesa deles. Segui-los, mantendo a distância.

Isso leva, necessariamente, a um trabalho descritivo. Uma boa descrição é um trabalho importante, uma vez que se torna ferramenta para pensar a ciência em construção, a ciência enquanto ela se faz. A ciência feita já passa a ser naturalizada, o que não interessa ao sociólogo. Quando estuda Pasteur, Latour retorna ao processo de construção da ciência para aquele pesquisador, focalizando as controvérsias de que foi objeto.

Quando se dirige ao laboratório, o sociólogo da ciência observa que existem várias salvaguardas antes de se chegar ao fim da experiência. Há vários atores responsáveis por observar, anotar e sistematizar todo o conhecimento sobre a natureza. Como ressaltou um colega da classe, o laboratório trabalha na prática para resolver um problema filosófico: a bifurcação da natureza, que precisa ser reinventada na experiência. É a tentativa de unir a natureza em seu próprio lócus à natureza experimentada no laboratório.

Outro aspecto metodológico destacado foi o da reflexividade, ou seja, tudo que um pesquisador da ciência disser sobre outra ciência será válido para a dele.
Posteriormente, a professora realizou um passeio pelos capítulos do livro. A cada capítulo os autores assumem um personagem metodológico diferente. Depois do primeiro capítulo de exposição do método, o capítulo 2 evidencia a prática etnográfica de anotar tudo. Seria a máxima de observar o laboratório como se observa uma tribo Bantu. Ou seja, colocando-se como total ignorante dos códigos, processos e dispositivos. O capítulo 3 é tratado por um historiador em guerra contra a Epistemologia. Para isso, faz a leitura de toda bibliografia sobre a enzima pesquisada, faz a história do objeto. Assim, verifica como foi sendo construído um fato importante a ser pesquisado. O capítulo 4 é trabalhado por um etnometodólogo atento à linguagem dos cientistas e que realiza uma micro-sociologia dos fatos. No capítulo 5, entra em cena o sociólogo mais clássico que possa existir. Trata do significado do capital científico e da credibilidade construída, bem como dos limites do reconhecimento. O capítulo 6 serve para reconciliar a “equipe” e trabalhar para fechar a questão da reflexividade. Na conclusão, os autores buscam a ordem criada a partir da desordem. O estudo não pode dizer que o trabalho dos cientistas sociais é superior ou inferior a nenhum outro. Em um sentido, não deixa de ser um tipo de ficção. “A única diferença é que os cientistas têm um laboratório”.
A professora também citou artigo de Latour “A referência circulante” no livro “A esperança de Pandora”. Nele, Latour segue pedólogos, biólogos e demais cientistas para descrever o sistema de referenciação do trabalho científico, ou seja, a produção técnica e científica que ajuda na classificação das coisas. Como transformar a natureza em palavras? A ciência traduz todo o trabalho de campo em palavras.

Outro caso citado foi o de Lissenko, como um exemplo de como a interferência de questões políticas e ideológicas é ruim para a ciência. No caso, Stalin apostou fundos em um pesquisador que considerava a genética ocidental algo burguês e que precisava ser abandonada pela política científica comunista. Isso se revelou um problema falso que causou grandes prejuízos à União Soviética.

Foi destacada também a necessidade de inscrever Latour na prática da etnografia para tentar compreendê-lo. A dificuldade em aplicar seu modo de estudo a outros objetos está na metodologia e não na teoria. Ainda que defenda realizar a extensão do laboratório para a compreensão da rede, Latour estuda o laboratório e não a rede.
Uma das críticas a Latour abordada em sala foi a do livro “Imposturas Intelectuais”, de Alan Sokal. A obra critica vários autores, inclusive Latour, denunciando pesquisas que não levariam a ciência a sério. Sokal indica um abuso de conceitos da ciência apropriados pela filosofia, principalmente por autores da Pós-Modernidade. Ele critica especialmente a linguagem de artigos e obras que fazem uma analogia incorreta entre ciências naturais e humanas. Nesse parêntesis, ficou destacado a pouca profundidade com que Sokal trata os autores criticados, tomando como exemplo a obra de Latour – criticado no livro de Sokal apenas a partir de um artigo.
“Dica” da Professora: o filme Medidas Extremas (com Harrison Ford), que mostra a questão do financiamento da pesquisa, envolvimento de laboratórios, etc.

3 – Ciência em Ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. De Bruno Latour.
A obra trata dos caminhos que a pesquisa toma (ou perde) para chegar a uma descoberta. Os fracassos e as crises. A apropriação que outros pesquisadores fazem do próprio instrumento de uma invenção (no caso do texto, foi descrito o caso do desenvolvimento o motor de Diesel).

É possível fazer ciência sozinho? Latour diz que não. São necessários aliados. O problema é como conseguir os aliados e como controlar as opiniões desses aliados. Como aceitar a ajuda, mas não perder o controle do que foi feito originalmente? Um risco é perder o crédito por ter feito ou ter tido a ideia para realizar aquele artefato, mas outro é não ter conseguido os aliados necessários para materializar a ideia.

Um dos conceitos principais trabalhados no livro é o de translação (tradução das ideias). Tem semelhança com o conceito de representação, próprio da Psicologia. A translação é a interpretação que uma pessoa tem de um determinado fato ou de uma determinada ideia. A partir disso, é preciso situar os termos e conceitos dentro de contextos que “aceitem” a translação feita (diz-se então que houve um alistamento). Todo conceito é uma tradução. E um conceito bom é aquele que convence.

O que seria o conhecimento para Latour? Em uma tentativa de resposta da professora e da turma, aceitou-se que o conhecimento não está escondido para ser descoberto. Ele é construído, negociado. Ele é aceito como conhecimento pelos outros. O conhecimento é acumulativo em parte, visto que há descartes. Por isso, o autor define estratégias essencialmente políticas de convencimento de outras pessoas e do controle das opiniões delas sobre determinado conceito ou artefato.

Uma ideia criticada em sala foi a de difusão. Por exemplo, a apropriação de tecnologia de países centrais por países periféricos leva a uma adaptação dos artefatos, construindo-se, praticamente outros. Os aliados é que vão definir as relações fortes e fracas. “Entender o que são fatos e máquinas é o mesmo que entender quem são as pessoas”. LATOUR, 2000, p. 232).

Uma ótima síntese do livro pode ser encontrada nos apêndices “As regras metodológicas” e “Princípios”.

Problema da teoria dele: cada caso é um caso. Cada Estudo de Caso não faz avançar tanto a teoria. Outro aspecto levantado por uma colega, é que se torna muito difícil limitar a rede. Como e onde seguir a rede? Latour ficaria obscuro no momento de aplicação. A professora defende que Latour traz importantes operantes para descrever o processo de produção da ciência.

Um colega destacou, por fim, outros livros de Latour: “Jamais fomos modernos” e “Políticas da Natureza”. Neles o autor trabalha questões importantes ligadas à epistemologia, à modernidade e ao estatuto da verdade.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Mensagem+IBM

Segue abaixo vídeo enviado pelo Karlo, cujo conteúdo está relacionado com o que estamos discutindo nas aulas. Segundo ele, o vídeo - feito pela IBM - trata de "avanços tecnológicos que irão alterar – na verdade já estão alterando – as formas de relacionamento entre as pessoas e as formas como se produz ciência".

O que acham? Comentários serão bem vindos!!

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Relatos da Sessão 7 - 6/10/2010

Relatos da Sessão 7 - Tema: A perspectiva construtivista ou sociotécnica

Por Manuel Franco Avellenada

A aula esteve dividida em três partes, assim: na primeira parte, retomaram-se algumas questões sobre a sessão anterior relacionadas com a linguagem; neste sentido, se mencionou a importância do estudo da linguagem na ciência e se referenciaram os trabalhos de Austin. De outro lado, fizeram-se rápidas apresentações sobre atividades realizadas pelos integrantes do grupo que não estiveram na sessão anterior, situação que levou à descrição rápida das propostas de ciência pós-normal, de Silvio Funtowicz, e de sistema-mundo, de Immanuel Wallerstein.

Na segunda parte, se começou com a apresentação de alguns dados biográficos sobre os autores do texto proposto para a aula, a saber: Trevor Pinch, que é professor do Departamento de Sociologia da Universidade de Cornell, e atualmente trabalha sobre as tecnologias da música; e Wiebe E. Bijker, que é professor da Universidade de Maastricht, na Holanda, e tem trabalhando em diferentes temas, tais como, o desenvolvimento da bicicleta, o desenvolvimento das lâmpadas fluorescentes, entre outros. Foram ainda apresentados alguns dados biográficos de Thomas Hughes – co-organizador da coletânea onde a versão original do artigo estudado foi publicada – que é professor emérito da universidade de Pennsylvania e tem um livro muito importante sobre os sistemas tecnológicos – “Networks of Power: Electrification in Western Society, 1880-1930” – o qual mostra os conflitos e os interesses envolvidos na construção do sistema de geração e distribuição de energia elétrica nos EUA e na Europa.

Especificamente relacionado com o texto, discutiram-se os elementos principais da metodologia de análise proposta, a qual reconhece a construção social da tecnologia como um modelo complexo, opondo-se ao modelo linear de inovação, baseado na idéia que se parte da ciência básica e se segue uma linha de desenvolvimentos aplicados até se chegar à utilização dos artefatos. Neste sentido, estes autores propõem os seguintes conceitos: Grupos sociais relevantes, que são aqueles mais diretamente interessados numa inovação dada; esses com freqüência são difíceis de identificar, mas têm a vantagem de ser uma categoria mais fácil de usar do que a categoria sociedade; Flexibilidade interpretativa, que remete às múltiplas interpretações para os achados científicos; Estabilização e fechamento da caixa preta, que se refere ao momento em que as controvérsias diminuem, pois começa a estabilização de uma idéia/construção de um artefato (movimento que é compartilhado pelos grupos relevantes). para isto joga especial importância a mídia. Além disso foi discutido o conceito de estrutura tecnológica.

Finalmente, com respeito à proposta destes autores, se mencionaram algumas dificuldades, tais como: a identificação dos grupos relevantes e o seu nível de participação, bem como a complexidade da análise quando a “caixa preta” não está fechada.

A terceira parte da aula abordou o texto publicado pela professora Benakouche, o qual foi escrito depois de seu estágio de pós-doutorado nos EUA. Este artigo recolhe de maneira muito pedagógica três correntes relacionadas com a sociologia da técnica, as quais compartilham uma nova metáfora – “abrir a caixa preta” da técnica – além de criticar o determinismo tecnológico, quais sejam:

1. Os grandes sistemas tecnológicos. O historiador Thomas Hughes pode ser considerado seu principal representado; esta proposta introduz conceitos, tais como: Reverse salient, que tem relação com os grandes obstáculos que defronta um sistema no processo de implementação, situação que na maioria dos casos movimenta importantes invenções, ao se tentar corrigir esses problemas. Outro conceito amplamente discutido na aula foi “Momentum”. Na discussão realizada, apareceram duas idéias para defini-lo: a primeira estaria relacionada com o momento no qual um produto tem sucesso, e a segunda acredita que este se refere ao momento no qual o sistema se expande rapidamente, atingindo “autonomia”. Do outro lado, com respeito à noção de sistema, assinalou-se que o mesmo, por definição, torna necessário um ambiente, razão pela qual é difícil identificar os limites de um sistema. Essa situação não existiria na idéia de rede, pois, nesse caso, “se está ou não se está associado” e a interação dependeria das relações entre as entidades (fortes ou fracas)

2. A tecnologia como construção social, que refere à proposta dos autores abordados na primeira parte da aula. Além do dito acima sobre esta proposta, se enfatizaram os seguintes pontos: a idéia de simetria, que permite explicar tanto as técnicas que dão certo como as que fracassam; a possibilidade de explicar as mudanças tecnológicas e as estabilizações; e a rejeição a se fazer distinções a priori entre o social, o técnico, o político/econômico. Foi também feita uma pequena discussão sobre o risco, que pode ser resumida na pergunta: quanto seguro é suficientemente seguro?

3. Enfim, abordou-se a noção de tecnologia como rede, perspectiva cujos principais representantes são Bruno Latour, Michel Callon e John Law. Eles propõem que é possível fazer uma análise ao mesmo tempo social e tecnológica, baseada nos envolvimentos entre atores humanos e não-humanos que estão numa rede (ator-network). Os principais elementos metodológicos discutidos foram: o conceito de “Tradução”, o qual tem correspondência com a idéia de flexibilidade interpretativa; e o conceito de associações, que dará depois o nome à proposta latouriana de uma sociologia das associações. Finalmente, foi assinalado o problema da linguagem que enfrenta esta proposta, pois se torna necessário propor novas palavras para designar conceitos emergentes, que traduzam a não-separação entre técnica e sociedade: por exemplo, “actantes” que substitui “atores”, e que serve para nomear tanto elementos humanos como não-humanos de uma rede.

Por Vanessa Delazeri Mocellin
O questionamento inicial que podemos levantar e que mais me chamou atenção durante a referida aula foi o fato de ainda não se entender ciência e tecnologia como duas vias mútuas e que andam juntas. Essa idéia aparece em ambos os textos trabalhados e merece aqui uma maior atenção: fica claro que não se concorda com a idéia de que a ciência e a tecnologia são totalmente distintas, nem também que a tecnologia é ciência aplicada; contudo, há também comumente a idéia de que a ciência e a tecnologia são a mesma coisa, quando não são. A idéia apresentada é que ambas andam juntas, e que a tecnologia pode ser entendida sociologicamente como sendo construída da mesma forma que a ciência. Isto permite fugir da idéia de impacto tecnológico – como se a tecnologia fosse uma entidade com vida própria – e sustentar a idéia de que a tecnologia pode ser entendida como parte da sociedade. É isto que nos mostra os autores Pinch e Bijker, quando defendem o construtivismo social da tecnologia, ou as três correntes da nova Sociologia da Técnica, tal como apresentadas pela professora Tamara em seu artigo, que são: a tecnologia como sistema, a tecnologia como construção social, e, finalmente, a tecnologia como rede.

É importante ressaltar aqui que a luta entre o pensar e o fazer sempre existiu; contudo se faz necessário, ao menos nos tempos atuais, pensar ciência e tecnologia através da idéia de que são interdependentes: uma dá apoio à outra, ou seja, a ciência dá apoio ao desenvolvimento das tecnologias e as tecnologias ao desenvolvimento das ciências. Esta interdependência, no entanto, é norteada por muitos conflitos e negociações, e nem sempre são feitas de forma linear, inclusive no sentido de divisão de trabalho dos cientistas e dos tecnólogos – em linguajar mais comum, quem trabalha pra quem? Não é possível definir.

Tais negociações não ocorrem somente na relação entre ciência e tecnologia, mas também na própria criação de uma determinada tecnologia, desde sua invenção até seu aprimoramento e consumo. Nesse sentido, Pinch e Bijker apresentam conceitos que definem um processo tecnológico como construído socialmente – os quais têm por pano de fundo a corrente que defendem: o construtivismo; tais conceitos são: grupos sociais relevantes, flexibilidade interpretativa e fechamento. O primeiro refere-se aos grupos diretamente envolvidos na construção de um artefato, seja por seu interesse a favor ou contra o determinado artefato; o segundo refere-se às possíveis interpretações que tal artefato pode ter durante o processo de construção, seja através dos materiais utilizados, por sua forma, conforto ou segurança – este foi o caso na construção do artefato bicicleta que conhecemos hoje; e o terceiro refere-se à conclusão desse processo de discussão sobre a melhor forma e funcionamento do artefato frente aos diversos interesses – deseja-se agradar a todos, para que todos possam consumir – no qual se estabelece uma “forma definitiva” – mesmo que momentaneamente, ao menos até que se surjam novas idéias e que causem nova discussão – para tal artefato, fechando-se, assim, a história de sua construção.

Assim, fica claro que existem interesses que determinam o desenvolvimento de um artefato, ou seja, que a mudança nos constituintes de tal artefato sofre influência dos grupos sociais ditos relevantes, e que cada grupo social relevante tem a urgência de que seus problemas com o artefato sejam enfrentados e que para cada problema existam soluções.

Já o texto da professora Tamara traz três abordagens que visam apresentar alternativas ao uso da noção de impacto tecnológico, como já foi mencionado. Sua crítica ao conceito de impacto tecnológico consiste em considerar que o mesmo é muito determinista e que falsifica de certa maneira o que é tecnologia – parece que a sociedade não se mexe e que a tecnologia simplesmente cai sobre as cabeças dos sujeitos sociais, sem que nenhuma intervenção tenha sido feita anteriormente. Sua crítica é sustentada pelas três abordagens que menciona em seu artigo (não entrarei em detalhes aqui sobre os conceitos de sistema e de rede, pois foram pouco trabalhados em aula), as quais, em resumo, afirmam que a tecnologia é e está inteiramente relacionada com a sociedade, e que todas as formas de associação desta – sistema ou rede, o conceito que for julgado mais completo – contribuem para a formação de uma tecnologia, seja por mediação do engenheiro que enfrenta a idéia, seja por quem financia a idéia, ou pelo usuário que a consumirá, por exemplo. Esta crítica de certa maneira invalida a idéia de que uma tecnologia é boa ou má devido apenas à formação do engenheiro; ou seja, formando-se um bom engenheiro se teria uma boa tecnologia? Não necessariamente!

Por fim, quero propor alguns questionamentos que tais textos me suscitaram:

1 - Quando se trata a tecnologia através do conceito de sistema e se propõe uma autonomia tecnológica através do conceito de “momentum”, nessa autonomia já não se encontraria o determinismo tecnológico? Desta forma seria mesmo a teoria sistêmica uma saída para a concepção de impacto tecnológico?

2 - Na teoria construtivista, o fechamento, mesmo que entendido como provisório, também não seria uma forma de determinar uma tecnologia? Afinal após o fechamento uma tecnologia é consumida e não há questionamentos sobre tal tecnologia – uma tecnologia dada é dada, geralmente não se questiona.

3 - Na teoria no qual o conceito de rede é chave, a proposta de não-humanos exercerem um papel e também poderem recusar papéis que lhes são atribuídos, não estaria tornando, de algum modo, estes não-humanos – que entendo como máquinas – em autônomos?

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Relatos da Sessão 6 - 29/9/2010

Relatos da Sessão 6 - Tema: Da ruptura kunhniana ao programa forte

Por Edson Jacinski


Iniciamos a aula com comentário da Tamara sobre livro organizado por Michel Serres sobre a história das ciências, que problematiza modos convencionais (lineares...) de se fazer história da ciência e apresenta outros modos, mais controversiais (ex.: um artigo de Latour sobre a polêmica entre Pouchet e Pasteur sobre a geração espontânea...). Também houve um relato do Cristian sobre uma palestra da Paula Sibilia, num Congresso no Rio Grande do Sul, a qual tratou da passagem atual do culto ao corpo para o "culto ao cérebro", especialmente considerando que já existem pesquisas buscando formas de transferir informações do cérebro para um corpo clonado e, dessa forma, garantir nossa imortalidade... Tais pesquisas trazem muitos questionamentos, que envolvem terrenos bastante movediços como "consciência", estudos neurológicos, utopias suscitadas com o desenvolvimento científico e tecnológico (em especial nas áreas da informática e das pesquisas envolvendo clonagem...)

Thomas S. Kuhn

a) informações preliminares sobre Thomas Kuhn
Sua formação inicial foi Física teórica, mas encaminhou seus estudos para a História da ciência, tendo mantido significativa interlocução com áreas das Ciências sociais, como Psicologia (Gestalt), Sociologia, História, Política e outras, como Matemática. Entre autores significativos para sua obra estão Popper, Bachelard, Koyré, Saussure. Uma referência importante foi Fleck (a quem Kuhn faz menção explícita no seu prefácio), mas alguns fleckianos costumam levantar suspeitas sobre até onde ele serviu de inspiração ou se Kuhn fez plágio de sua obra... Em contraposição a tal argumento, alguns kunhianos alegam que Kuhn reuniu essas idéias de um modo inusitado e lhe deu outras características... A mesma controvérsia se deu em relação a Polanyi.
Alguns conceitos-chave de sua obra são: paradigma, revolução científica, incomensurabilidade, ciência normal, etc.

b) questionamentos sobre a obra de T. Kuhn

Paradigma: a comunidade científica acredita nele ou têm consciência que segue um determinado paradigma? Um primeiro aspecto a considerar é que o paradigma não se restringe apenas a uma teoria, mas inclui a questão metodológica, um modo de ver os problemas... Em relação à comunidade científica, a ênfase da análise kunhiana recai sobre a educação científica, os manuais de iniciação científica que formam os cientistas dentro de um determinado paradigma. A princípio, essa consciência de estar num determinado paradigma ou de existirem outros, ocorreria nos momentos de crise dos paradigmas, em que começam a surgir anomalias que não são resolvidas dentro do paradigma dominante. Esse talvez seja um momento propício para que essa consciência (histórica) esteja mais presente e advenham questionamentos sobre os próprios fundamentos (filosóficos) do paradigma.

As ciências sociais podem ser consideradas ciências?
A resposta negativa de Kuhn (seriam ciências pré-paradigmáticas envoltas em intermináveis dissensos...) em relação a essa questão não deixa de ter um aspecto irônico e paradoxal, na medida em que ele utiliza muitos dos conhecimentos das Ciências sociais para fazer sua análise social e histórica das “ciências maduras". Aliás, esse é outro aspecto a ser considerado: outros “cientistas sociais”, como Merton ou Mannheim, também mostraram aspectos sociais da ciência, mas não tiveram o mesmo reconhecimento ou repercussão junto à comunidade acadêmica que teve Kuhn... (aspecto que irá interessar posteriormente aos estudos latourianos das ciências...). Tal questão levou a se reconhecer algumas diferenças que se estabelecem em relação à avaliação da produtividade científica das ciências naturais e das ciências humanas como, por exemplo, o maior peso atribuído - nos coletivos das ciências naturais - para a produção de artigos científicos em vez de livros (individuais ou coletivos) em cada área de saber... A propósito dessa questão, Tamara lembrou palestra do famoso filósofo da ciência, Mário Bumge, na UFSC, em que afirmou a "não cientificidade" da Psicanálise.

Que área das ciências sociais já adquiriu um paradigma?
Esse questionamento foi trabalhado por Octavio Ianni, num artigo clássico, em que aborda “a crise dos paradigmas nas ciências sociais”. Num sentido mais amplo, no caso da Sociologia, são considerados paradigmáticos os autores da tríade “sagrada”: Marx, Durkheim e Weber. Outro aspecto considerado, a partir de A. Giddens, foi que a Sociologia pratica a “dupla hermenêutica: “os sociólogos interpretam a interpretação que os indivíduos fazem da sociedade”. Tal questão remete às próprias fronteiras tênues entre o conhecimento sociológico e conhecimento do senso comum... No caso das Ciências naturais, essas fronteiras parecem ser mais rígidas. No entanto, a obra kunhiana trouxe uma contribuição importante para dessacralizar esse território, questionando as concepções mais convencionais de racionalidade científica da tradição epistemológica. Seu entendimento de racionalidade estaria mais relacionado a uma concepão mais instrumental. Nesse sentido, talvez seja interessante leituras como a que Bourdieu fez de T. Kuhn (na obra “Para uma sociologia da ciência”), relacionando sua obra ao movimento da contra-cultura dos anos 60, especialmente por ter colocado em xeque o modelo de racionalidade científica ocidental.

David Bloor e o Programa Forte da Sociologia da ciência

Primeiramente, assistimos a um trecho de filme sobre Darwin (A Criação), em que ele descobre que Wallace havia publicado um artigo com idéias semelhantes às suas. Tecemos algumas considerações sobre o filme e outras produções audiovisuais que tematizam a ciência e a tecnologia (ex. filme “1984”, baseado em obra de G. Orwell, “Galileu Galilei” de B. Bretch, Giordano Bruno, Frankenstein, etc.), especialmente sobre o caráter controversial e o tom bélico que assumem os discursos científicos nesses momentos. Sobre as controvérsias da obra de Darwin nos EUA foi citado ainda o filme “O vento será sua herança”.

a) alguns dados biográficos de D. Bloor
Nasceu em 1942 na Escócia. Sua formação e seus estudos estiveram relacionados às áreas da Filosofia, Sociologia, Psicologia (doutorado) e Matemática. Desenvolveu o projeto chamado de “Programa Forte”, também conhecido como Escola de Edimburgo (Unidade de Estudos da Ciência da Universidade de Edimburgo), em parceria com outros sociólogos, dentre os quais Barry Barnes. Dentre os seus significativos interlocutores estão Popper, Kuhn, Wittgenstein, Latour

b) questionamentos sobre a obra de D. Bloor

Por que Programa Forte (PF)?
Primeiramente, porque pretendia ter um alcance maior do que chamaram “Programa Fraco” (R. Merton) da Sociologia da Ciência, que se limitava apenas às “externalidades” da questão, sem adentrar no território sagrado, isto é, nos aspectos cognitivos da ciência. Desse modo, o PF visava entender a ciência enquanto prática social ou “abrir a caixa-preta” da ciência. Uma das forma como tal intento se materializou foi através dos estudos etnográficos de laboratório (K.Knorr-Cetina e Latour). Outro aspecto é que o PF, através do princípio de simetria, procurou examinar sociologicamente não apenas os sucessos como os casos fracassados do conhecimento científico, aspecto que foi radicalizado posteriormente pelos estudos de Latour, Callon e outros. Foi ressaltado também o seu princípio da reflexividade: tudo o que se disser das outras ciências também deve ser aplicado à própria Sociologia da Ciência. Por exemplo, caso se considere a relatividade dos conhecimentos produzidos pelas outras ciências, isto também deve ser aplicado ao próprio conhecimento produzido pelos sociólogos da ciência...

A Sociologia da Ciência pode investigar o conteúdo do conhecimento científico?
Na perspectiva do PF todo o aspecto cognitivo é social e, portanto, a Sociologia da Ciência deve ocupar o lugar da Filosofia da Ciência. Tal questão irá provocar fortes reações nos coletivos da Filosofia da Ciência, contrapondo-se ao que seria considerado um reducionismo sociológico da racionalidade. Assim, um questionamento levantado foi em relação ao caráter não social da lógica, o que pode ser contestado a partir de considerações sobre as relações indissociáveis entre linguagem e pensamento... Outro aspecto a considerar é que esse embate Sociologia da ciência x Epistemologia também tem uma dimensão territorial, política (participação maior da população na produção científica e tecnológica; disputa por financiamento da ciência e tecnologia,etc.)
Um outro questionamento foi sobre a distinção entre valores epistêmicos e valores sociais na produção do conhecimento científico, cuja identificação pelo PF foi problematizada. Um exemplo de tal dilema foi a interrogação sobre a presença ou não de valores sociais na construção de aviões. Em parte, talvez, os parâmetros de segurança utilizados podem remeter a essa questão. De qualquer forma, parece estar em jogo as aporias densas envolvendo relações (deterministas ou não?)natureza x sociedade...Nessa mesma toada, foi levantada a questão sobre “a natureza do conhecimento científico”: estaria, por exemplo, a ciência vinculada à sua capacidade de previsão? (o que parece levar a reterritorializá-la ao campo epistemológico...). A esse propósito, Boaventura de Souza Santos considera que seja melhor falar em ciências e não em ciência, ou seja, não só as ciências sociais e naturais são diferentes, como entre as próprias ciências naturais há significativas diferenças que necessitam ser levadas em consideração.

Por Laura Guerrero

Na aula se discutiram dois textos: “A estrutura das revoluções científicas” de Tomas Kuhn e “Conhecimento e imaginário social” de David Bloor.
A aula começou discutindo o texto de Kuhn. Foi apresentada a bibliografia dele, dando-se ênfase na sua formação como físico e no seu interesse na História da ciência. Foi destacado o seu aporte na ruptura da visão linear na história da ciência e o seu conceito de Paradigma. Foi colocada a polêmica do possível plagio do Kuhn a outros autores como Ludwik Fleck ou Michael Polanyi. Mas, ainda que a obra de Kuhn possa ter muitos pontos em comum com outros autores, resulta importante resgatar que no seu livro, quando ele trata das revoluções cientificas, foi a primeira vez que foram colocados todos esses pontos juntos, articulados da forma que Kuhn o fez, o que foi novo para a ciência e para a história das ideias.
Para o autor estadunidense, a ciência passa pelos momentos de ciência normal, que se baseia num paradigma; de revolução científica; e de consolidação de um novo paradigma. No debate sobre o que Kuhn entende como paradigma, foi colocada a pergunta sobre a diferença entre paradigma e teoria, e se chegou ao consenso de que ainda que não seja fácil diferenciá-los, o paradigma é um conceito mais amplo, no qual podem coexistir muitas teorias diferentes, ou seja, um paradigma pode conter várias teorias.
Ainda que Kuhn quisesse fazer uma análise para as Ciências naturais e especialmente para a Física, o seu trabalho foi apropriado para outras áreas. No entanto, no caso das Ciências sociais parece problemático o uso desse modelo já que elas podem ser entendidas como a-paradigmáticas ou multi-paradigmáticas; por isso não poderiam ser pensadas da mesma forma que as naturais.
Mesmo que o trabalho de Kuhn tenha sido muito polêmico, é importante ressaltar que ele faz um aporte importante na história da Sociologia da ciência, já que é um dos primeiros cientistas com formação nas ciências duras que questiona o entendimento do trabalho científico como um processo de acumulação e, pelo contrário, o apresenta como um processo de rupturas.
A segunda parte da aula esteve dividida em dois momentos: no primeiro, foram discutidas algumas questões relacionadas com o que significa fazer ciência e como ela está sempre marcada por embates e conflitos. O tema foi levantado a partir da exibição de um trecho do filme “A criação”, dirigido por Jon Amiel, que aborda a vida de Darwin. No segundo momento, o debate foi dirigido ao texto de Bloor, especialmente ao primeiro capítulo e ao posfácio, e as principais questões levantadas na aula foram as que seguem.
David Bloor, que atualmente trabalha na Universidade de Edimburgo, na Escócia, e que tem formação em Sociologia, Filosofia e Psicologia, é um dos principais representantes do Programa Forte em Sociologia das ciências. É um grande crítico de Bruno Latour, especialmente se opondo à propriedade de agencia que Latour coloca no não-humano.
O Programa Forte faz uma crítica a autores como Merton e Mannheim, que segundo ele fazem uma análise fraca da ciência. O Programa Forte defende então uma nova base epistemológica para a Sociologia da ciência; essa deve procurar analisar as ciências como uma prática social, e assim falar desde dentro, o que os representantes do Programa vão chamar como “abrir a caixa preta da ciência”, ou seja, questionar suas bases epistemológicas, colocadas pela Filosofia clássica, pelas quais o conhecimento estaria além do social. Para Bloor, o conhecimento cientifico deve ser entendido e analisado como uma construção social e nesse sentido, observa-se que ele está atravessado por embates, conflitos e problemas.
No debate da aula foram colocadas algumas questões relevantes sobre as repercussões que essa abordagem trouxe e ainda traz para pensar o trabalho científico e especialmente na Sociologia da ciência e da técnica. Nesse sentido, foi destacado o princípio da simetria que o Programa Forte defende e que tem sido um dos menos contestado. Foi discutido também o tema dos valores (sociais e epistêmicos) que Bloor traz e como resulta importante desconstruir a ideia que “o mundo natural é vazio e neutro”.
Finalmente, foi destacada a relevância do Programa Forte na mudança das metodologias na pesquisa da Sociologia das Ciências, especialmente como resultado à pergunta que ele faz sobre como deve ser a forma para se investigar o conteúdo e a natureza do conhecimento científico.
No final da aula ficaram algumas perguntas interessantes que permanentemente permeiam a disciplina, sobre o papel da ciência, sua capacidade de previsão e sobre a tensão existente entre “o social” e “o natural” nos debates sobre conhecimento cientifico.

Sugestões de livros e filmes que surgiram da aula:
Livros:
Michel Serres. Elementos para uma história das ciências. 1989.
Pierre Bourdieu. Para uma sociologia da ciência. 2004.
Bertolt Brecht. Leben des Galilei (A vida de Galileu) 1943.
Filmes:
Inherit the Wind (O vento será sua herança). Dirigido por Stanley Kramer. Ano 1960.
Creation (A criação). Dirigido por Jon Amiel. Ano 2009.